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Toy Story 5: ninguém está roubando a sua trilogia

por ytools
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Quase trinta anos depois de o Woody gritar que tinha uma cobra na bota, a Pixar resolveu abrir de novo o baú de brinquedos. «Toy Story 5» vem aí e, como era de se esperar, a internet se dividiu imediatamente. De um lado, quem jura que a história já terminou perfeitamente lá atrás.
Toy Story 5: ninguém está roubando a sua trilogia
Do outro, quem não vê problema nenhum em mais uma aventura, contanto que o filme seja bom e não transforme a franquia em uma caricatura de si mesma.

O diretor Andrew Stanton, veterano de Pixar, sabe bem que muita gente está cansada de continuações. Mesmo assim, ele responde com certa calma e até um pouco de dureza: ninguém está roubando a sua trilogia. Na visão dele, os três primeiros filmes contam uma saga fechada sobre a vida do Andy com seus brinquedos – a famosa «fase Andy». Se para você o final definitivo é aquele adeus no quintal, beleza: esse final continua ali, intacto. O que vem depois não apaga nada, só pergunta o que acontece com esses personagens quando o tempo passa e o mundo muda.

Vale lembrar esse caminho. O primeiro «Toy Story», de 1995, foi uma revolução em animação e também em como contar histórias para a família: por trás da rivalidade entre um cowboy de plástico e um patrulheiro espacial, tinha uma trama muito pé no chão sobre ciúme, insegurança e amizade. A continuação ampliou o universo, apresentou novos personagens marcantes e consolidou a franquia. Já «Toy Story 3», em 2010, fez algo raro: cresceu junto com o público. Andy estava indo para a faculdade na mesma idade de muitos fãs que tinham visto o primeiro filme no cinema. Quando ele passa Woody, Buzz e companhia para a Bonnie, muita gente sentiu que estava se despedindo da própria infância.

Por isso não é surpresa que tanta gente enxergue o terceiro filme como o final perfeito. Parecia aquela última carta que você escreve para o seu eu criança: obrigado pelos momentos, agora é hora de seguir em frente. Só que em 2019 veio «Toy Story 4» e quebrou essa sensação de ponto final. Em vez de focar em um novo dia a dia no quarto da Bonnie, o filme virou uma espécie de road movie, com direito ao neurótico Garfinho, a um parque de diversões e ao retorno da Bo Peep com um novo papel na vida do Woody. Para alguns, foi um jeito corajoso de falar sobre propósito e escolha própria. Para outros, a trama soou mais fraca, esticada demais, como um epílogo que ninguém tinha pedido.

Não faltam fãs que acreditam que, se algum filme deveria ter servido de ponte para uma nova geração de brinquedos, esse filme era o quarto. A ideia de deixar o elenco clássico descansar em paz, aparecendo só em participações especiais, e dar protagonismo completo a novos personagens, é algo que muita gente defende até hoje. Em vez disso, é justamente Woody e Buzz que voltam ao centro da história em «Toy Story 5» – e isso incomoda quem acha que a franquia deveria crescer junto com o público, em vez de ficar eternamente girando em torno dos mesmos rostos de plástico.

O conceito da quinta parte mira num tipo de crise bem atual. Stanton já adiantou que o grande desafio do filme vai girar em torno de um aparelho em formato de tablet, um símbolo de todos os gadgets que sequestraram a atenção das crianças. A ideia não é transformar a tecnologia em vilã de desenho simplista, e sim levantar a pergunta incômoda: o que significa ser brinquedo num mundo em que a brincadeira acontece, na maior parte do tempo, em uma tela? Como um cowboy de pano disputa espaço com jogos, vídeos e aplicativos infinitos? E será que ele precisa disputar de fato, ou existe um outro jeito de continuar relevante?

Esse choque entre o analógico e o digital não é exatamente inédito no catálogo da Disney. Filmes como «Detona Ralph» e sua sequência já brincaram com a relação entre personagens clássicos e o universo da internet. Justamente por isso há quem sinta déjà vu ao ouvir a premissa de «Toy Story 5» e diga que não tem interesse em ver seus personagens favoritos enfrentando mais uma «crise existencial». Para fãs que se enxergam no Andy, qualquer coisa depois daquele adeus no carro parece invasão em um álbum de memórias que eles já tinham fechado com cuidado.

Por outro lado, existe um público bem mais pragmático. A visão deles cabe em uma frase que aparece direto nos comentários: não gostou, é só não assistir. Se para você «Toy Story» acaba no terceiro ou no quarto filme, o streaming está aí para congelar a franquia exatamente no ponto em que faz mais sentido. Para muita gente mais nova e para pais de crianças pequenas, a discussão é menos dramática: enquanto os filmes forem divertidos, emocionantes e bem feitos, não tem problema se existirem cinco, dez ou vinte. Eles querem que a geração de hoje também tenha sua própria experiência de ver Woody e Buzz na tela grande, em vez de viver só de nostalgia emprestada.

Acima de toda essa briga de fã, tem um dado financeiro impossível de ignorar. «Toy Story 4» passou da marca de 1 bilhão de dólares nas bilheterias, enquanto vários projetos originais recentes da Pixar tiveram desempenho bem mais tímido. Alguns agradaram a crítica, mas não estouraram com o grande público; outros, como «Lightyear», decepcionaram geral. Nesse cenário, voltar à marca «Toy Story» é o movimento mais previsível do mundo: é segurança criativa, mas principalmente segurança para o caixa.

O próprio Pete Docter, chefão criativo da Pixar, já admitiu que existe o risco de virar uma fábrica de sequências se o estúdio ouvir só o que o público já sabe que gosta. A piada dele sobre um futuro com «Toy Story 27» não parece mais tão exagerada quando olhamos para a agenda cheia de continuações. «Toy Story 5» está exatamente nesse ponto de equilíbrio frágil: tem tudo para ser mais um capítulo honesto sobre envelhecer, mudar e encontrar sentido num mundo de telas, mas também pode reforçar a impressão de que a Disney está apenas ordenhando a nostalgia até a última gota.

No fim das contas, o legado de «Toy Story» não vai ser definido pelo simples fato de existir um quinto filme, e sim por quão necessário ele vai parecer quando as luzes do cinema se acenderem. Se Stanton e sua equipe conseguirem resgatar o humor leve e o coração das duas primeiras aventuras, sem fugir das perguntas difíceis que a era dos tablets traz, há chance real de surpreender até o fã mais desconfiado. E se, para você, o verdadeiro fim continua sendo o Andy indo para a faculdade ou o Woody seguindo caminho próprio com a Bo Peep, essas versões continuam valendo. Sua trilogia – ou quadrilogia – continua lá, prontinha na prateleira. O que muda é que, em outra sala, uma nova geração de crianças está prestes a abrir a caixa de brinquedos pela primeira vez.

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