A nova colaboração entre a TAG Heuer e a Fragment Design não chega de mansinho: ela entra na conversa como um manifesto de estilo. O TAG Heuer Carrera Chronograph x Fragment Limited Edition pega o já marcante Carrera Glassbox de 39 mm e o transforma em um objeto quase arquitetônico, feito de preto, branco, sombras e superfícies foscas. 
É um relógio pensado tanto para o entusiasta de mecânica quanto para quem vê a peça como parte do guarda-roupa – algo entre instrumento de medição e acessório de streetwear de luxo.
A parceria entre TAG Heuer e Fragment não é novidade. Desde 2018, a equipe liderada por Hiroshi Fujiwara vem reinterpretando modelos da Carrera e da linha Formula 1, sempre com uma pegada monocromática e um olhar muito atento ao passado da Heuer dos anos 60 e 70
. Desta vez, eles voltam ao Carrera Glassbox e, em vez de apenas trocar cores, praticamente redesenham a presença visual do relógio no pulso, apostando em minimalismo extremo e em texturas pesadas que dividem opiniões logo no primeiro olhar.
Caixa e silhueta Glassbox: o mesmo formato, outra atitude
Em termos de medidas, nada aqui é revolucionário. A caixa continua em aço inoxidável com 39 mm de diâmetro, asas angulares inclinadas para baixo, botões de cronógrafo em formato de pistão e coroa robusta, tudo muito familiar para quem já experimentou um Carrera moderno. 
As chanfros polidos ao longo das laterais ainda estão ali, cortando a luz e lembrando que, apesar da linguagem mais industrial, trata-se de um relógio de luxo com bons acabamentos.
O que realmente define a presença do modelo é o cristal em formato de cúpula – o famoso Glassbox. Em vez de um aro tradicional, o cristal de safira ocupa toda a superfície superior, formando uma espécie de bolha contínua de vidro de uma ponta à outra da caixa. De perfil, ele remete à ficção científica dos anos 60, só que reinterpretada para um contexto urbano e contemporâneo. Dependendo do ângulo, parece que o mostrador está colado na parte interna do cristal, como se o tempo estivesse aprisionado ali dentro.
Virando o relógio, encontramos um fundo em safira com o logotipo de raio duplo da Fragment aplicado sobre o vidro. A resistência à água permanece em respeitáveis 100 metros, suficiente para o uso diário sem paranoia. Ou seja: apesar do visual claramente voltado ao design, a base técnica continua a mesma da linha Carrera Chronograph em produção regular.
Mostrador minimalista: entre ferramenta e fashion
É no mostrador que a edição Fragment realmente se separa de qualquer outro Carrera. Em vez de indexes metálicos aplicados, temos pequenos quadrados cinza-claro impressos, quase tímidos. Eles marcam as horas, mas fazem isso de forma tão discreta que, de longe, o mostrador parece um grande bloco preto, recortado apenas pelas aberturas dos subdials e pelas linhas da escala periférica. O resultado é uma sensação de vazio calculado – como uma página em branco na qual só ficaram as informações que o designer decidiu poupar.
As ponteiros principais, em contrapartida, permanecem polidos e facetados, típicos da família Carrera. Neste contexto de mostrador super fosco, eles se tornam o principal elemento de brilho, quase como joias voando sobre um fundo de concreto. Cada movimento do pulso faz as arestas refletirem a luz, enquanto o resto do mostrador absorve tudo. É um contraste que reforça a ideia de que o relógio é feito tanto para ser lido quanto para ser observado como objeto.
Os três subdials são, talvez, o ponto mais controverso do projeto. Ao invés de numerais claros, temos somente escalas impressas em cinza muito suave, sem diferenciação forte entre marcações de minutos ou segundos. Para quem realmente usa o cronógrafo no dia a dia, isso pode frustrar: é preciso um pouco mais de esforço para entender o tempo decorrido. Já para o público que vê o cronógrafo como parte da estética, e não como ferramenta, essa limpeza visual é justamente o que torna o relógio tão desejável. É o clássico conflito entre função e forma – e aqui a forma ganhou o debate.
A janela de data também foi redesenhada. Em vez da posição tradicional às 6 horas, a data sobe para as 12, alinhando-se ao eixo vertical do mostrador e equilibrando a composição. A moldura é simples, preta e fosca, sem brilho desnecessário. Em algumas datas, aparece o ícone de raio da Fragment no disco, um detalhe pequeno, mas que faz os fãs da marca sorrirem quando surge no dia certo.
Capítulo duplo, textura pesada e o falso bezel branco
Outro elemento que muda bastante a leitura do relógio é o anel de capítulo em dois níveis, uma marca do Carrera moderno. Na edição Fragment, a parte externa desse anel recebe um acabamento branco fosco e granulado, enquanto a área central permanece escura. O efeito é quase de um bezel interno branco, desenhado sob o cristal. Isso reduz visualmente o diâmetro do mostrador e, ao mesmo tempo, emoldura as indicações principais, como se o Glassbox fosse uma vitrine para um mini painel gráfico lá dentro.
É nesse anel branco que vive a escala taquimétrica, ainda completa, mas impressa em prata bem clara. Dependendo da iluminação, os numerais podem praticamente desaparecer, reforçando a ideia de que a função está lá mais por respeito à herança de cronógrafo do que por intenção real de uso
. Para alguns colecionadores, isso é quase um sacrilégio; para outros, é a prova de que o relógio assume sem medo sua vocação de peça de design, não de cronômetro de pista.
Todo o conjunto de superfícies do mostrador segue a mesma lógica de brutalismo elegante: nada de efeitos radiais, nada de subdials com textura diferenciada. Fundo e contadores compartilham a mesma granulação forte e fosca. Vista de perto, a textura lembra um material arquitetônico, mais do que um acabamento relojoeiro tradicional. É uma escolha que reforça a identidade da Fragment e, ao mesmo tempo, distancia esse Carrera das releituras vintage mais românticas.
Calibre TH20-00: o motor leva o relógio a sério
Por trás de toda essa estética minimalista, o conteúdo mecânico é tudo menos simplificado. O Carrera Chronograph x Fragment é equipado com o calibre de manufatura TH20-00, um movimento automático moderno que coloca a TAG Heuer em pé de igualdade com muitos concorrentes na faixa de preço. Ele trabalha a 28 800 alternâncias por hora e oferece um excelente reserva de marcha de até 80 horas – na prática, você pode tirar o relógio na sexta à noite e encontrá-lo funcionando na segunda-feira sem precisar reajustar.
O cronógrafo utiliza roda de colunas e embreagem vertical, a dupla preferida dos entusiastas por proporcionar acionamento suave dos botões e início imediato do ponteiro central, sem “saltos” bruscos. É um conjunto técnico que dialoga diretamente com o público mais nerd de relojoaria e serve de contraponto à imagem de “relógio de moda” que alguns enxergam no design.
Do lado estético, o movimento aposta em uma mistura de limpeza industrial e toques clássicos. A ponte principal recebe largas faixas de Côtes de Genève, enquanto outras partes ficam mais simples e modernas. O rotor em formato de escudo típico da TAG Heuer é vazado e ganha um grafismo preto que conversa com o logo Fragment impresso no vidro do fundo. Curiosamente, a roda de colunas aparece em metal polido, sem a cor chamativa que a marca costuma usar em outros modelos – mais um detalhe em favor da paleta monocromática.
Pulseira e presença no pulso
A pulseira é outro ponto em que a colaboração se destaca. A base é o bracelete de sete elos típico dos Carrera atuais, uma reinterpretação mais angulosa dos antigos beads-of-rice. Só que aqui há um truque visual: o elo central, fino e levemente elevado, recebe um revestimento preto que cria uma faixa escura correndo por todo o comprimento da pulseira. O contraste entre aço brilhante e essa linha preta dá ao relógio um ar quase “stealth”, mas sem perder sofisticação.
No pulso, o conjunto causa uma sensação curiosa. O diâmetro de 39 mm torna o relógio usável em praticamente qualquer tamanho de pulso, mas o cristal alto e o anel branco interno fazem com que ele pareça, ao mesmo tempo, compacto e espesso. Alguns podem achar que lembra um pequeno “disco” metálico mais grosso do que as fotos sugerem. O fato é que ele não passa despercebido: a borda clara sob o cristal e a linha preta na pulseira chamam atenção mesmo de longe.
Preço, público e a discussão sobre envelhecer bem
Com produção limitada a 500 unidades e preço oficial em torno de 8 150 francos suíços, algo próximo de 9 mil dólares, este Carrera x Fragment não está tentando ser o cronógrafo mais racional da vitrine. Ele mira um público muito específico: colecionadores que entendem a história da TAG Heuer, acompanham o trabalho de Hiroshi Fujiwara e enxergam valor em uma peça que conversa ao mesmo tempo com moda, cultura pop e tradição relojoeira.
É claro que isso alimenta polêmicas. Muitos entusiastas vão argumentar que, por esse valor, é possível comprar cronógrafos mais legíveis, mais clássicos e, na teoria, mais “úteis”, inclusive dentro do próprio catálogo da TAG Heuer. Outros vão defender que o conjunto – movimento de manufatura, tiragem limitada, linguagem de design coerente e apelo de collab – justifica o preço dentro da lógica do mercado atual. No fim, tudo se resume a prioridades: quem quer o máximo de função por franco investido provavelmente vai olhar para outro lado; quem procura algo com forte identidade visual, vai considerar este modelo.
Resta a pergunta: esse design vai envelhecer bem? Há quem aposte que o minimalismo radical, os subdials quase “sem informação” e o foco no lado fashion vão datar o relógio rapidamente, tornando-o um objeto típico desta década, destinado a passar mais tempo na caixa do que no pulso depois da lua de mel inicial. Outros enxergam justamente o contrário: uma peça que registra com clareza um momento da relojoaria, em que colaborações e estética de rua influenciam até as maisons suíças mais tradicionais. Daqui a vinte anos, essa mistura pode soar ainda mais interessante.
Veredito: um Carrera que escolhe um lado
O TAG Heuer Carrera Chronograph x Fragment Limited Edition é tudo, menos neutro. Ele não tenta agradar a todos, nem esconder que privilegiou o impacto visual sobre a legibilidade perfeita. Para alguns entusiastas, isso é um erro; para outros, é justamente o charme. Técnicamente, ele entrega um calibre moderno e competente, uma construção sólida e especificações respeitáveis. Esteticamente, assume sem medo a postura de peça de design, quase um crossover entre relógio e acessório de moda premium.
Se você enxerga o cronógrafo como ferramenta, talvez veja aqui um belo exercício de estilo pouco prático. Se, por outro lado, gosta de relógios que contam histórias, dialogam com a cultura urbana e não têm medo de dividir opiniões, este Carrera x Fragment provavelmente já fisgou sua atenção. De qualquer jeito, ele cumpre o papel mais difícil em um mercado saturado: ser lembrado.