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OD de Hideo Kojima: o experimento de terror que pode fracassar e mudar tudo

por ytools
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Em uma indústria em que quase todo grande estúdio vende o próximo lançamento como sucesso garantido, é curioso ver Hideo Kojima admitir em voz alta que talvez seu novo projeto não dê certo. Foi exatamente isso que ele fez ao falar de OD, seu experimento de terror.
OD de Hideo Kojima: o experimento de terror que pode fracassar e mudar tudo
Para o criador de Metal Gear Solid e Death Stranding, essa dúvida não soa como falsa modéstia: é praticamente um aviso de que ele está tentando algo que foge do que o público está acostumado a chamar de jogo de terror.

Ao longo da carreira, Kojima virou sinônimo de aposta arriscada. Com Metal Gear Solid, transformou o stealth em um grande filme interativo, cheio de quebras de quarta parede e ideias que pareciam maluquice na época. Já com Death Stranding e sua sequência, ele tentou redefinir o que é um jogo de mundo aberto, focando em conexões entre jogadores em vez de só tiro e explosão. Para parte da comunidade, isso foi visionário; para outra parte, virou só um “simulador de entregas” bonito e arrastado. OD nasce no meio dessa divisão, cercado tanto de expectativa quanto de cansaço com o nome Kojima.

Em uma entrevista recente, ele explicou que, dessa vez, a ousadia não se limita à narrativa ou a alguma mecânica excêntrica. Segundo Kojima, até agora seus projetos mais estranhos ainda cabiam em estruturas conhecidas: você compra o jogo, joga a campanha, volta para algumas missões extras e pronto. Com OD, a ideia é mexer na própria forma como o jogo é oferecido. Quando ele fala em mudar o “modelo de serviço” desde a base, está sugerindo uma experiência que pode funcionar mais como plataforma em evolução do que como um pacote fechado e tradicional.

O que isso significa na prática ainda é um mistério. Podemos imaginar um terror que se desenrola em tempo real, com eventos limitados a certos dias ou horários, e que você simplesmente perde se não estiver lá. Ou um mundo compartilhado em que as escolhas do público inteiro, e não só do jogador individual, vão moldando o rumo da história. Talvez OD misture jogo, streaming e teatro interativo, com espectadores influenciando o que acontece com quem está jogando. Seja qual for o formato final, dá para entender por que o próprio Kojima admite que pode não funcionar: é difícil, caro e nem todo mundo está disposto a embarcar em algo tão diferente.

Por enquanto, o que temos são trailers estranhos, cheios de closes incômodos, sorrisos forçados e atuações que parecem mais ensaiadas para palco do que para um filme de Hollywood. Kojima jura que os vídeos estão lotados de pistas, e que basta assistir com atenção, rever e teorizar para ir sacando a ideia. O segundo trailer, em especial, já virou material de dissecação quadro a quadro. Expressões dos atores, trechos de falas, símbolos no fundo – tudo passa a impressão de que a regra número um de OD é deixar o público sem saber ao certo o que está vendo. Essa confusão inicial é, em si, um tipo de terror psicológico.

Não surpreende que a comunidade esteja dividida. Alguns enxergam na frase “não sei se isso vai dar certo” a prova de que Kojima continua arriscando, em vez de cair na tentação de reciclar fórmulas que já funcionaram antes. Outros dizem que a fase realmente criativa dele ficou lá atrás, na época de MGS4, e que depois disso ele se perdeu em cenas longas demais, discursos sobre solidão e caminhadas infinitas. Tem gente que não engole até hoje a estética de Death Stranding e já define OD como “mais uma viagem de ego” antes mesmo de saber exatamente o que o jogo é.

Também existem críticas ao tipo de elenco e de figuras públicas que ele gosta de usar como rostos digitais. Em tempos em que qualquer celebridade carrega polêmicas na bagagem, parte do público não quer ver certas pessoas estampando mais um grande projeto. Para esses jogadores, a simples escolha de quem aparece em OD já é motivo para ignorar o jogo, independentemente da proposta. É um risco calculado: a mesma imagem que chama atenção e rende manchetes pode afastar consumidores que, em outras circunstâncias, talvez experimentassem a novidade.

Por trás de tudo isso existe um contexto maior: o cansaço com o terror blockbuster. Muitos grandes títulos ainda seguem, com pequenas variações, a cartilha que Resident Evil ajudou a consolidar: recursos escassos, cenários fechados, jump scare na hora certa e, às vezes, um modo online que quase nunca mexe no coração da experiência. OD se vende como a antítese disso, ou pelo menos tenta. A promessa é de um horror construído em cima de incerteza, de sensação de que o jogo pode mudar enquanto você não está olhando, e de medo não apenas do que aparece na tela, mas de perder algo que talvez nunca se repita.

Claro que mirar tão alto tem preço. Nem o status de lenda protege um diretor quando a proposta é complicada demais de explicar e difícil de encaixar na rotina de quem só quer chegar em casa e jogar algumas horas. Kojima já viveu esse embate outras vezes: toda vez que anunciou um caminho estranho, parte da galera fez piada e previu fiasco. Alguns desses riscos viraram clássicos; outros ficaram como obras cult, amadas por poucos e ignoradas pelo resto. Com OD, ele parece abraçar essa incerteza desde o início, quase transformando o jogo em um experimento aberto, em que todo mundo acompanha o processo e julga o resultado em tempo real.

Ainda tem a questão do calendário. Death Stranding 2 acabou de chegar, com versão para PC ainda no horizonte, e isso por si só é um compromisso enorme para o estúdio. OD deve estar a alguns anos de distância, tanto em desenvolvimento quanto em marketing. Talvez a forma mais saudável de olhar para o projeto, por enquanto, seja como um laboratório de ideias de terror, e não como o grande lançamento que vai competir com tudo no ano que vem. Se ele sair do papel mantendo esse espírito experimental, já terá feito mais do que muitos blockbusters acomodados.

No fim das contas, OD encapsula bem o estado atual dos jogos AAA. A opção mais segura é repetir a fórmula até o público enjoar; a alternativa é arriscar, admitir em público que existe possibilidade real de fracasso e, ainda assim, seguir em frente. Hideo Kojima, com todos os exageros e polêmicas, escolheu claramente o segundo caminho. Se OD conseguir transformar essa ansiedade criativa em um tipo novo de terror – menos sobre sustos e mais sobre a sensação de que você nunca tem controle total do que está acontecendo – o experimento pode valer a pena até para quem hoje jura que já se cansou dele.

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