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Netflix compra a Warner Bros por US$ 82,7 bilhões e cria um novo supergigante de séries, filmes e games

por ytools
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A Netflix acaba de provocar um daqueles momentos em que a indústria inteira precisa parar, respirar fundo e recalcular rota. A empresa anunciou um acordo para comprar a Warner Bros por impressionantes 82,7 bilhões de dólares, levando junto HBO, HBO Max, os estúdios de cinema e TV e, para surpresa de muita gente, o braço de games WB Games. Se os órgãos reguladores derem o sinal verde, veremos Stranger Things dividindo o mesmo telhado corporativo com Game of Thrones, Harry Potter, Batman e Mortal Kombat – tudo dentro do ecossistema da Netflix.

Para entender como chegamos aqui, é preciso voltar alguns anos.
Netflix compra a Warner Bros por US$ 82,7 bilhões e cria um novo supergigante de séries, filmes e games
Em 2021, a AT&T decidiu se desfazer de parte do seu império de mídia e juntou a divisão WarnerMedia com a Discovery. O acordo foi anunciado em maio daquele ano e concluído em abril de 2022, dando origem à Warner Bros. Discovery (WBD). Parecia o nascimento de um novo superconglomerado – mas a festa durou pouco. Cerca de um ano depois, a diretoria aprovou outro grande rearranjo interno: separar o negócio em dois blocos, um focado em Streaming & Studios (a parte que cresce e dá lucro) e outro, Global Linear Networks, com os canais de TV tradicionais e margem apertada. Oficialmente, o desmembramento seria concluído até meados de 2026, mas logo analistas e investidores começaram a ler isso como preparação para uma venda estratégica.

A partir daí, boatos não faltaram. Nomes como Sony, gigantes de tecnologia e fundos de investimento circularam como possíveis compradores do braço de streaming e estúdios. De acordo com relatos de bastidores, a WBD de fato avaliou múltiplas propostas até o mês passado, comparando não só o valor oferecido, mas também sinergias, estrutura de pagamento e riscos regulatórios. No fim, a Netflix colocou na mesa o pacote considerado mais convincente: dinheiro vivo, ações e uma narrativa clara de longo prazo para o mercado financeiro. Em vez de ser apenas mais um player comprando catálogo, a Netflix se apresenta como a empresa que vai pegar um século de história de Hollywood e ligá-lo direto à maior base de assinantes do mundo.

Mas o que exatamente está indo para o lado vermelho da força do streaming? O acordo inclui os estúdios Warner Bros Pictures e Television, HBO, HBO Max e uma biblioteca que é praticamente um museu vivo da cultura pop: de clássicos como Casablanca e Cidadão Kane a franquias modernas como Matrix, Harry Potter, O Senhor dos Anéis (onde houver direitos), além de séries icônicas como Friends, The Big Bang Theory, Sopranos e as produções mais recentes do universo Game of Thrones. Já a porção Discovery – canais de lifestyle, reality, documentários e boa parte do negócio linear – permanece em outro bloco corporativo, por enquanto fora do alcance da Netflix. Em suma, o que está à venda é o coração criativo da Warner, a parte que cria as histórias que o público realmente lembra.

O ponto que mais gerou dúvidas até a confirmação oficial foi WB Games. Durante meses, analistas apostaram que o braço de games seria vendido à parte ou fatiado por franquias. Em vez disso, a Netflix levou o pacote inteiro. Isso significa que estúdios como Avalanche Software (Hogwarts Legacy), NetherRealm Studios (Mortal Kombat e Injustice), Rocksteady Studios (série Batman Arkham e Suicide Squad: Kill the Justice League) e TT Games (jogos LEGO) passariam para dentro do grupo Netflix, caso tudo se concretize. Vale lembrar que a própria WB Games passou por uma reestruturação pesada recentemente: fechamento de estúdios como Monolith Productions e PlayerFirst Games, saída do CEO David Haddad e foco declarado em quatro pilares: DC, Game of Thrones, Harry Potter e Mortal Kombat. Resta saber se a Netflix vai seguir esse plano mais enxuto ou abrir novamente o leque de projetos.

Para a Netflix, essa aquisição é ao mesmo tempo solução e problema para um velho desejo: entrar de vez no mundo dos games. A empresa já flertou com o setor de várias formas. Comprou a Night School Studio, apostou em um catálogo de jogos mobile embutido na assinatura, trouxe pequenos estúdios independentes para dentro de casa e até fundou uma equipe interna para criar um action RPG AAA comandado por veteranos da indústria. O projeto, porém, foi encerrado discretamente cerca de um ano depois, e um dos estúdios adquiridos, Spry Fox, acabou voltando para os antigos donos. Em outras palavras, faltava consistência. Agora, a estratégia muda de patamar: em vez de tentar construir uma divisão de jogos do zero, a empresa compra franquias que já têm milhões de fãs em consoles e PC.

É aqui que entra a grande aposta de sinergia. A Warner chega com universos e personagens extremamente reconhecíveis, que já rendem bilheterias, maratonas de série e toneladas de produtos licenciados. A Netflix contribui com um alcance global quase sem paralelo, uma plataforma tecnologicamente madura e um algoritmo acostumado a empurrar novos conteúdos para o público certo. Em teoria, nada impede que, em alguns anos, o assinante veja um novo spin off de Harry Potter, feche o episódio e, ainda no mesmo app, inicie uma sequência de Hogwarts Legacy ou outro jogo ambientado no mesmo universo. O mesmo vale para DC, Game of Thrones ou Mortal Kombat, com séries alimentando jogos e jogos retroalimentando o interesse nas séries. O grande “porém” é que transformar essa visão em produto exige acertos em tecnologia, licenciamento, experiência de usuário e modelo de negócios.

Nos comunicados oficiais, o tom é, claro, triunfal. Ted Sarandos, co CEO da Netflix, voltou a falar na missão de “entreter o mundo inteiro” e destacou como a combinação do catálogo histórico da Warner com fenômenos atuais da própria Netflix – Stranger Things, Squid Game, produções coreanas e animes originais – cria um ecossistema de histórias quase inesgotável. Greg Peters, o outro co CEO, concentrou seu discurso em números e eficiência: segundo ele, o know how de produção da Warner, somado à base global de assinantes e ao modelo de assinatura recorrente da Netflix, deve gerar valor por décadas, não só nos próximos trimestres. A mensagem para investidores é cristalina: mais franquias fortes, mais formatos para explorá las, mais tempo de tela e menos dependência de licenças de terceiros.

Do outro lado, David Zaslav, CEO da Warner Bros. Discovery, vende o negócio como uma forma de preservar e amplificar o legado do estúdio. O escudo da Warner acompanhou alguns dos maiores momentos do cinema e da TV no último século. Zaslav argumenta que ancorar essa marca dentro da Netflix garante que esses conteúdos continuem relevantes em um mundo em que a TV aberta e o cabo perdem força ano após ano. Em termos práticos, a operação também ajuda a aliviar a pesada dívida da WBD e permite que a parte que sobra – Discovery e canais lineares – se concentre em seu nicho, sem carregar o risco financeiro de blockbusters de cinema e mega séries.

Antes de tudo isso virar realidade, porém, existe um obstáculo nada trivial: os reguladores. A previsão é que a conclusão do negócio leve entre 12 e 18 meses, justamente porque o acordo terá de passar pelo crivo de órgãos como a FTC e o Departamento de Justiça nos Estados Unidos, além de autoridades de concorrência na União Europeia e outros mercados chave. Num momento em que governos demonstram cada vez mais resistência a fusões gigantes em tecnologia e mídia, não é difícil imaginar questionamentos sobre concentração de catálogo e poder de barganha. Críticos já falam em mais um passo rumo a um cenário em que poucas empresas ditam o que a maior parte do planeta assiste e joga.

Entre o público, o sentimento é tudo menos unânime. De um lado, há quem veja a notícia como o pacote dos sonhos: um só login liberando HBO, clássicos da Warner, originais da Netflix e, em algum momento, grandes jogos baseados em DC, Harry Potter e Game of Thrones. Do outro lado, muita gente reage com desconfiança e cansaço. A Netflix virou alvo frequente de debates culturais, acusada por parte da audiência de seguir uma “linha editorial” muito uniforme. Esses espectadores temem que, sob o guarda chuva da Netflix, as criações da Warner sejam padronizadas ao mesmo tom e que projetos mais arriscados ou incômodos percam espaço. Há ainda uma leitura mais econômica e menos ideológica: mais um mega negócio em um mercado cada vez mais concentrado, o que costuma significar menos competição, catálogos parecidos e preços que só sobem.

Para o assinante comum, porém, as perguntas imediatas são bem práticas. O que acontece com a marca HBO Max – ela vira um extra dentro da Netflix, uma nova camada premium ou some de vez? Quanto tempo vai levar para que filmes e séries da Warner hoje presos em contratos com outros streamings voltem para o recém criado “super app”? A compra vai servir de justificativa para mais um aumento de preço? E como fica a rígida política contra compartilhamento de senha, que a Netflix apertou há pouco tempo, contrariando as previsões de colapso mas irritando muita gente? Nenhuma dessas respostas está clara neste momento, e isso alimenta tanto expectativa quanto ansiedade.

No front dos games, as apostas são igualmente altas. A WB Games construiu a reputação de entregar títulos cinematográficos, com foco em narrativa e alto valor de produção, frequentemente alinhados à experiência dos filmes e séries. Sob o comando da Netflix, o grupo pode ser incentivado a abraçar com mais força o modelo de jogos como serviço, a lançar produtos sempre em sinergia com estreias de séries ou a testar formas de acesso por assinatura que diluam a ideia tradicional de “comprar” um jogo. Fãs já lotam redes sociais com pedidos de um mundo aberto moderno de Superman, de um RPG denso ambientado em Westeros ou de uma continuação de Hogwarts Legacy chegando direto, no dia um, para quem já paga a mensalidade da plataforma.

Seja qual for o desfecho, o recado está dado: a fase dois da guerra dos streamings não é mais sobre quem lança o próprio serviço, mas sobre quem consegue sobreviver à onda de consolidação. A primeira etapa foi marcada pela corrida de cada estúdio para recuperar seus conteúdos e erguer seu próprio app. Agora, começa uma etapa em que alguns se fundem, outros se especializam e outros simplesmente saem de cena. Uma Netflix turbinada com a Warner Bros vira, na prática, o novo padrão de comparação para o resto do mercado. Se os reguladores aprovarem e a integração for minimamente bem executada, as histórias que nascerem desse novo colosso têm tudo para definir como veremos séries, filmes e grandes jogos na próxima década.

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